Professoras Desesperadas

Ninguém é tão grande que não possa aprender, nem tão pequeno que não possa ensinar.


Opinião: A escola é deles

A civilização ergueu-se sobre este princípio simples, de que a escola, na ausência da família, constituía um instrumento coercivo.
No dia 1 de Junho, Cavaco Silva atendeu a Selecção de futebol e pediu que os respectivos jogadores fossem “um exemplo para as crianças”. A 3 de Junho, Cristiano Ronaldo, presumível herói da criançada, agrediu um luxemburguês em pleno campo, proeza ao que parece recorrente e que o herói atribui a “andar excitado”.
O senhor Presidente não precisa de aconselhar exemplos destes aos infantes da República: os infantes já andam excitados que chegue. Segundo as estatísticas, é vulgar que os alunos dos liceus transportem navalhas e pistolas. Em 2004/2005 houve 1232 ‘ofensas à integridade física’ nas escolas e, no mesmo período e pelas mesmas ofensas, 191 pessoas receberam tratamento em hospitais. É a famosa violência escolar, que um documentário da RTP devolveu à ribalta e que os ‘peritos’ se apressaram a dissolver no nevoeiro justificativo do costume.
Não vale a pena. As crianças são violentas porque percebem que, à semelhança do que acontece com o exemplar Cristiano, as suas acções, brutais que sejam, ficam impunes. Coitadas: elas espancam, assaltam e insultam porque podem. Neste sentido, e em última instância, as crianças de facto não têm culpa. Não por serem pobrezinhas ou estarem ‘em risco’, como sugerem sociólogos, psicólogos e demais entulho da caridade social: por serem humanas.
O ‘bom selvagem’ só existiu na lenda e na cabeça alucinada de Rousseau. Se entregue aos seus instintos, o homem desliza fatalmente para a selvajaria. Logo, não convém que o homem esteja entregue aos seus instintos. A civilização que temos ergueu-se sobre este princípio simples, de que a escola, na ausência da família, constituía um instrumento coercivo essencial. Infelizmente, a civilização que temos já dispôs de melhores dias. E da escola nem se fala.
Pense-se nas evidências que acompanharam as últimas décadas: a sacralização da criança, a erosão da autoridade tradicional, o relativismo, a desvalorização do saber, etc. Acrescente-se professores maus ou aterrorizados, políticas ‘compreensivas’ e manadas de pais empenhados na ‘ocupação’ (mas não na educação) dos rebentos e o resultado não deve espantar. A violência, no fundo a luta pelo poder, nem é a questão, dado que sempre existiu, e em toda a parte. A violência escolar não começou ontem, apenas o seu monopólio foi transferido de uma ordem legitimada, isto é, dos docentes, para os petizes, que entretanto, naturalmente, assumiram o controlo. O poder, por assim dizer, caiu na rua. Ou, para sermos exactos, no recreio. Os pedagogos reclamavam com ardor uma “escola para os alunos”? Meus caros: ei-la.
A solução? Ai, ai, a solução implicaria a presença da Polícia nas escolas, a aplicação de bastonadas nos desordeiros e a possibilidade de fechar os mais renitentes em jaulas. Sucede que os nossos governantes são gente sensível, que ressente no coração essa rude profilaxia e nas sondagens a impopularidade subsequente.
A outra hipótese é deixar correr e consolarmo-nos com raras compensações, como a taxa de natalidade, que em Portugal vem atingindo mínimos inéditos. Eu sei que as crianças são o futuro. Mas, com esta escola, é preferível que o futuro não sejam as crianças.


Alberto Gonçalves, Sociólogo (albertog@netcabo.pt)

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