Professoras Desesperadas

Ninguém é tão grande que não possa aprender, nem tão pequeno que não possa ensinar.


REALIDADES-14: "Bullying" esbarra em incompreensão

Casos de "bullying" continuado já levaram à morte de jovens em Portugal. Quem o afirma é Beatriz Pereira, professora e investigadora do Instituto de Estudos da Criança da Universidade do Minho, que adianta que um desses casos ocorreu ainda este ano, embora, tal como outros, não tenha sido assumido como tal, ou seja, um caso extremo de abuso sistemático de poder e de intimidação. Segundo aquela investigadora, os casos registados em Portugal são, no entanto, pontuais.
Basicamente, o "bullying", expressão inglesa com difícil tradução para português, consiste, segundo Alexandre Ventura, do departamento de Ciências da Educação da Universidade de Aveiro, "na violência física e/ou psicológica consciente e intencional exercida por um indivíduo ou um grupo sobre outro indivíduo, ou grupo, incapaz de se defender e que, em consequência de tal agressão, fica intimidado, podendo ver afectadas as respectivas segurança, auto-estima e personalidade".
Gozar, chamar nomes, ameaçar, empurrar, humilhar, excluir de brincadeiras e jogos são actos de todos os dias, que acontecem "desde sempre, desde que há crianças". E a isto se chama "bullying". Algo que muitas vezes é considerado pelos adultos como "saudável" e "uma boa forma de aprender a viver e a defender-se" e que pode deixar marcas para toda a vida.
Segundo Alexandre Ventura, o "bullying" pode marcar a personalidade de uma pessoa para sempre ao torná-la débil na capacidade de comunicação, ao torná-la incapaz de se afirmar em termos sociais, profissionais e amorosos.
As vítimas de "bullying" tornam-se muitas vezes pessoas tão frágeis que chegam mesmo a tentar o suicídio.
E o pior é que, ainda segundo aquele pedagogo, quando as vítimas procuram denunciar as situações em que vivem, "são mal recebidas, acabando por ser também vítimas de incompreensão".
Num seminário dedicado ao tema "Bullying - intimidação nas escolas", realizado pelo Centro Social de Paramos, no âmbito do projecto "Aprender em movimento", na Escola Secundária Dr. Manuel Laranjeira, em Espinho, Alexandre Ventura e Beatriz Pereira alertaram para a necessidade cada vez mais premente de despertar as consciências de todos para o fenómeno e as suas consequências.
Beatriz Pereira salientou a importância de existir nas escolas um espaço, um gabinete, aonde os jovens, vítimas ou simples testemunhas, possam ir denunciar aquilo que viveram ou viram acontecer. "Normalmente, as vítimas sofrem em silêncio. Sentem-se ridículas e até culpadas pelo facto de serem vítimas. Os órgãos de gestão, os professores, os auxiliares de acção educativa e os pais têm de assumir as suas responsabilidades, deixarem de aceitar como normal o que é aberrante e injustificado e agir", concluiu Alexandre Ventura.

Os predicados de uma potencial vítima
Ser recém-chegado a uma escola e ter ali poucos amigos íntimos é uma das características de muitas das vítimas. Ser tímido, viver num meio familiar superprotector, pertencer a um grupo racial ou étnico diferente da maioria, possuir uma diferença óbvia (como ser muito gordo ou muito magro, coxear, gaguejar), ter necessidades educativas especiais ou deficiência ou pelo simples facto de comportar-se de forma considerada imprópria, ser maçador ou intrometido são factores que fazem de um jovem uma potencial vítima.

Efeitos ou indícios de possível "bullying"
Os efeitos do "bullying" são vários. Baixa auto-estima, medo, pesadelos, rejeição da escola, insegurança, ansiedade, dificuldade de relacionamento interpessoal, dificuldade de concentração, diminuição do rendimento escolar, dores de cabeça ou de estômago, mudanças repentinas de humor, vómitos, urinar na cama, falta de apetite, choro, insónia, aumento de pedido de dinheiro e até roubos em casa e surgimento de objectos estragados ou desaparecidos sem que seja dada uma explicação para tal.

Jovem de 12 anos diz ter vivido num inferno
Chamemos-lhe João e à mãe, Maria. O João tem 12 anos e frequenta o 7.º ano numa das escolas mais bem conceituadas do Porto. Quando em Setembro do ano passado ingressou, contrariado, diga- -se, naquele estabelecimento de ensino, era uma criança franzina, um daqueles meninos a quem normalmente se diz que falta dar o pulo.
Tímido e introvertido por natureza, o João começou subitamente a dar sinais de um comportamento agressivo, inclusive para com o irmão mais novo.
"Sem ninguém perceber de onde aquilo vinha, começou a reagir de forma muito violenta com o irmão. Tentei falar com ele por diversas vezes, mas ele respondia-me sempre que eram coisas da vida dele e não dizia mais nada", conta Maria.
Longe de imaginar a dura realidade, Maria resolveu, porém, tomar uma atitude guardar o historial das conversas que o filho mantinha no "messenger".
"Certo dia, depois de ele ter tido um comportamento ainda mais estranho, resolvi ler as mensagens. Deparei-me com uma conversa dele com uma amiga onde ele dizia que estava a viver um verdadeiro inferno na escola, onde dizia que apanhava pancada todos os dias de um brutamontes de 1,70 metros de altura", recorda a mãe de João.
"Fiquei em estado de choque. Não conseguia parar de chorar. A minha primeira reacção foi pensar «Como é que eu não vi isto?». Só então comecei a juntar pormenores soltos que agora faziam todo o sentido: um telemóvel partido, um blusão desaparecido, o testemunho do irmão que dizia que ele regressava da escola numa louca correria", lembra.
Maria acabou por saber mais tarde que uma professora já havia feito um relatório sobre casos de violência na turma e que havia mais vítimas. Indignada, exigiu medidas ao director de turma, que começou por dizer que aquilo "eram coisas de miúdos", acabando, no entanto, por dar uma reprimenda à classe ameaçando-a com um conselho disciplinar.
Segundo a mãe do João, as coisas estarão mais calmas, mas não totalmente resolvidas.

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