Centros educativos não são fiscalizados há 5 anos
0 Comments Published by . on quinta-feira, junho 01, 2006 at 3:42 da tarde.Quando a Lei Tutelar Educativa entrou em vigor, a 1 de Janeiro de 2001, foi também criada "uma comissão independente" para acompanhar o Ministério da Justiça na fiscalização dos centros educativos.
Ora, essa "entidade fiscalizadora", organismo plural que contém um representante da tutela e para o qual as primeiras nomeações ocorreram apenas em Julho de 2003, nunca chegou a tomar posse. Ou seja, os centros que albergam jovens que, tendo cometido crimes, não têm idade para estar nas prisões não estão a ser fiscalizados há mais de cinco anos.
O artigo 209.º da lei aprovada em 1999 mas que apenas entrou em vigor em 2001 explicita a composição da comissão - dois representantes da Assembleia da República (AR), um do Governo, um do Conselho Superior da Magistratura, um do Conselho Superior do Ministério Público e dois de organizações não governamentais de apoio à criança. E precisa também as suas funções: "solicitar informação sobre o funcionamento dos centros" e "efectuar visitas sempre que o julgue necessário". Para tal, fixa-se que "a comissão tem livre acesso aos centros educativos e é apoiada pelo Ministério da Justiça nos termos que forem fixados por portaria".
A portaria mencionada foi publicada mais de um ano após a aprovação da lei, a 20 de Dezembro de 2000, e diz: "Manda o Governo (...) que o apoio técnico e administrativo ao funcionamento da comissão independente (...) seja prestado pela Secretaria-Geral do Ministério da Justiça." A portaria - assinada pelo na altura secretário de Estado adjunto do ministro da Justiça, Eduardo Cabrita, que viria a ser um dos representantes posteriormente nomeados pela AR para a referida comissão - não estabelece as regras de funcionamento da entidade, por exemplo, organização, local, modo de actuação, meios à disposição e formas de executar a fiscalização.
Só passados quatro anos da aprovação da lei é que foram feitas as primeiras nomeações para a comissão, concretamente a 28 de Julho de 2003, data da resolução da AR que indica Eduardo Cabrita e a jurista e ex-deputada Teresa Morais. Será preciso esperar por um despacho de 31 de Janeiro de 2005, assinado por José Pedro Aguiar Branco, ministro da Justiça do Governo de Santana Lopes, para ficar a conhecer os restantes cinco elementos da comissão. A 27 de Maio de 2005, o processo de nomeações sofreria uma alteração, na sequência da entrada de Cabrita no Executivo de José Sócrates, tendo sido indicada, em substituição, Maria Ferreira Dinis.
Membros indignados com convite para cerimónia
Apesar de nomeados há um ano, os membros da comissão nunca tomaram posse, nunca foram informados da sua efectiva instalação. Acima de tudo, nunca exerceram o seu poder - e dever - de fiscalização dos 12 centros destinados à reintegração social de 270 crianças e jovens delinquentes.
Ainda assim, os membros da comissão receberam um convite do Instituto de Reinserção Social (IRS) - responsável pela gestão dos mesmos centros educativos - para estarem presentes na cerimónia de entrega de vistos de residência a menores estrangeiros internados nos centros, que decorre hoje.
Questionado sobre a paralisação da comissão, o Ministério da Justiça, através do seu gabinete de imprensa, enviou um esclarecimento escrito ao PÚBLICO onde afirma: "Não compete ao Ministério da Justiça, nem ao IRS, promover ou dirigir qualquer reunião da comissão, a qual é por lei independente, cabendo-lhe portanto autogerir-se, contando com o (...) apoio técnico e administrativo da Secretaria-Geral e a colaboração institucional do IRS." E acrescenta que "em final de 2005", o IRS colocou "à disposição dos membros da comissão, os quais foram devidamente notificados", dossiers sobre os centros "para eventual apoio da comissão". E realça que "apenas dois dos sete dossiers foram levantados".
Contactada pelo PÚBLICO, Teresa Morais, membro da comissão, garantiu: "Nunca fui contactada pela Secretaria-Geral. Recebi apenas há uns meses uma carta da ex-presidente do IRS [Maria Clara Albino] informando que tinham sido entregues dossiers à Secretaria-Geral. Não considero que caiba a nenhum dos membros convocar os restantes para uma reunião. A comissão é independente na sua actuação, mas depende da tutela para ter os meios e as condições para exercer a sua função." Adiantando que, "em protesto", recusou o convite do IRS e pondera "renunciar ao mandato se a comissão não for instalada em tempo breve", vincou: "Não contarão comigo para papéis protocolares e decorativos." E sublinhou: "Estão a fazer-se alterações significativas nos centros educativos, como fechar alguns, transferir jovens, vender património... Não era relevante que a comissão estivesse a funcionar? Ou só será informada quando a reforma estiver completa?"
"Se existe comissão, ela devia funcionar. Para tal, precisa de ter o mínimo de condições e não houve ainda uma decisão que as garantisse", corroborou o advogado Carlos Pinto Abreu, membro indicado pela tutela, analisando: "Isto já não é mau funcionamento das instituições, isto é não-funcionamento." E asseverou: "[A comissão] não é útil, é imprescindível." Pinto Abreu desconheceu durante um ano que integrava a comissão (ver texto ao lado).
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