Professoras Desesperadas

Ninguém é tão grande que não possa aprender, nem tão pequeno que não possa ensinar.


REALIDADES-18: Canudo social contra marginalidade

Durante nove meses aprenderam o bê-à-bá do ofício que escolheram. Começaram por ser 30. Acabam 25. São homens e mulheres que apostaram em mudar de rumo, metendo numa gaveta mágoas de um passado ainda recente, onde violência, droga e delinquência eram constantes. "Ser capaz" é o nome do projecto que lhes abriu portas à esperança e ao trabalho, fruto de uma parceria entre a associação União e o Instituto de Reinserção Social. As aulas, que decorreram na sede da instituição, na Rua do Breiner, no Porto, acabam hoje. Amanhã, há diplomas. Ontem, caíram lágrimas gratas por cursos que simbolizam nova oportunidade. O medo da estigmatização, porém, ainda pesa.
"Ponha aí Zé Manel. Não é o meu nome, mas a minha mãe vai saber que sou eu. E ficará contente". Aos 18 anos, "Zé Manel" passa, amanhã, a ser profissional de alimentação/mesa bar. A promessa de um emprego aumenta as cautelas e cria muitas entrelinhas no relato da sua história. "Sabe como é. Se virem a minha cara ou lerem o meu nome, se calhar voltam atrás", diz, com uma certeza de quem está habituado a "ser olhado de esguelha".
Aos 13 anos, "Zé Manel" foi apanhado "num episódio que meteu roubo e más companhias". Acabou num "colégio de correcção". Há nove meses, começou a tirar o curso. "Aprendi um ofício e a confiar em mim. O diploma é um prémio para a minha mãe. Vai compensar a tristeza que lhe causei", sublinha.
Tal como o rapaz, também "Joana" esconde o rosto e o nome verdadeiro. Vítima de violência doméstica, tem numa casa de abrigo o lar do sossego. "Descobri que afinal tenho valor. Não sou inútil como me disseram, enquanto me enchiam o corpo de pancada". O curso de auxiliar de infantário está feito . Espera agora colocação. "É difícil, mas vou à luta. Tenho uma filha para criar".
"A nossa missão é dar formação no âmbito do programa operacional Emprego, Formação e Desenvolvimento Social. Mas devolver a auto-estima também é importante", sublinha Luísa Serra, coordenadora do projecto.
Marlene Alves, 25 anos, concorda com a técnica. Depois de sair, absolvida, de uma acusação de ter ordenado uma agressão, viu-se "sem rumo". Através do Instituto de Reinserção Social, foi parar ao curso da União. Amanhã, será auxiliar de geriatria. "A associação devolveu-me a vontade de recomeçar. Até me ajudou na colocação de uma banda gástrica no Hospital de S. João, no Porto. Há um mês pesava 120,5 quilos. Emagreci 21 e quero chegar aos 54 ou aos 62", relata.
Henrique Piedade, 35 anos, era, ontem, um dos formandos mais entusiasmados com o curso de carpintaria de cofragem. "Sempre gostei de trabalhar a madeira. Só falta quem me dê trabalho". O diploma é encarado por este ex-toxicodependente como uma "dádiva". "Para quem perdeu tudo e chegou a arrumar carros, ter um curso representa que não posso voltar atrás", garante.
A entrega de diplomas (25 relativos a cursos ministrados no Porto e 12 em Braga) está marcada para amanhã, no Governo Civil portuense. "Será um dia de festa. Mas, depois, cabe a eles aproveitarem a ferramenta que receberam", lembra Luísa Serra, acrescentando, todavia, que "nasceu uma nova família".

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